“Por fim, ao revisar e reestruturar o sistema de incentivos fiscais, o Brasil tem a oportunidade de promover um desenvolvimento mais sustentável e equitativo, na perspectiva da redução das desigualdades regionais e das tragédias humanas na Amazônia e sua infraestrutura precária e letal.”
Por Nelson Azevedo (*) [email protected]
Vidas humanas importam e precisam de mais cuidados. O acidente trágico de Barcelos, divulgado pelo mundo afora, fonte de desespero e sofrimento, constrange especialmente a quem vive, trabalha e investe na Amazônia e não desfruta de infraestrutura capaz de prover segurança e conforto a quem deseja fazer a experiência florestal. Aqui não importa apontar culpados pois isso envolveria juízos de valor e cobrança de responsabilidades por parte do próprio tecido social. Essa reflexão tem o propósito de alertar para responsabilidades e direitos que precisam ser mobilizados para evitar tragédias e assegurar o ir e vir das pessoas em condições de conforto e, principalmente, segurança.
E não se trata de falta de recursos. E sim de gestão eficaz. Temos repetido que a proteção ambiental e florestal da Amazônia exige finalidade econômica. O exemplo da BR-319 que liga Manaus a Porto Velho é eloquente e oportuno. Afinal, se houvesse manutenção de infraestrutura rodoviária entre Porto Velho e Manaus não teríamos perdido tantas vidas na crise de oxigênio. O socorro ao Amazonas demorou mas veio. Entretanto, veio por terra, numa estrada lamaçal, a rodovia federal que liga o Amazonas ao resto do país. A mesma lama que comprometeu o voo que matou 14 turistas em Barcelos. Os destruidores da floresta não precisam de estrada com manutenção para grilar e desmatar a região. Os indicadores oficiais confirmam. Mas a fiscalização e o flagrante precisam. E muito.
Falta gestão eficaz
Vale e Petrobras
Reportagem da Folha, coincidentemente, trouxe no fim de semana, os indicadores dos investimentos públicos, baseados em incentivos fiscais federais, para a Amazônia. Um 1documento recente produzido pelo Inesc, o Instituto de Estudos Socioeconômicos, baseado nos dados da Receita, referentes a 2021. São projetos aprovados pela Sudam e Sudene, que destacam dois beneficiários, no mínimo, curiosos, a Vale e a Petrobras.
Sudam e Sudene
O estudo do Inesc usa como base de dados as informações da Receita, que em 2023 divulgou os valores relativos a 2021, e dados gerais de projetos aprovados por Sudam e Sudene. A Vale, com um portfólio tenebroso de tragédias que poderiam ter sido evitadas, recebeu R$ 18 bilhões dos R$ 42 bilhões de incentivos fiscais em 2021 da Sudam e da Sudene. E a Petrobras, a quinta do ranking de beneficiadas, com pouco mais de R$ 800 milhões. Ambas lideram o ranking das empresas multadas pelo Ibama. Entre os demais, o grande destaque é o agronegócio e as estrangeiros que investem em combustíveis fósseis.
Descuido da sustentabilidade
Com base nas informações apresentadas, é evidente que o sistema de incentivos fiscais, apesar de potencialmente vantajoso para o desenvolvimento econômico, tem sido frequentemente direcionado a empresas que não seguem padrões sustentáveis e proteção florestal. É vital reestruturar o sistema para que privilegie empresas verdadeiramente comprometidas com práticas socioambientais e infraestrutura para atividades que demonstrem compromissos com a região, sobretudo com a geração de emprego e oportunidades, ou seja, ações de infraestrutura que sejam sustentáveis e permitam a redução de impactos ambientais.
Tecnologias verdes
Incentivos Além disso, fomentar a interiorização do desenvolvimento exige começa, principalmente, por expandir a oferta de qualificação de recursos humanos e do estímulo a atividades que mantenham a floresta em pé. Em lugar de incentivar ações contrárias ao clima, priorizar incentivos para Tecnologias Verdes, pesquisa e implementação de tecnologias e práticas ecológicas através de benefícios fiscais específicos, com a expansão dos programas prioritários de Bioeconomia e Tecnologia da Informação e de Comunicação. Isto poderia incluir a produção de energias renováveis, técnicas agrícolas sustentáveis e processos industriais com baixa emissão de carbono.
Educação e qualificação
Adicionalmente, Sudam poderia fomentar Educação e Qualificação em Sustentabilidade, criando programas de formação técnica e profissional focados em práticas sustentáveis, reflorestamento de áreas degradadas, capacitando os recursos humanos parecesse fim. Isso poderia criar empreendedores em reflorestamento com espécies de alto valor comercial como seringueira, castanheiras, mogno e sumaúma para a indústria de artefatos de borracha, alimentação e construção civil. Já contribuímos com o FMPES, aproximadamente R$300 milhões a cada ano, para Micro e Pesquemos empreendedores.
Priorizar micros e pequenos empresários
Ao invés de focar grandes corporações, direcionar incentivos para pequenas e médias empresas que empregam práticas sustentáveis, promovendo assim o desenvolvimento local e a diversificação econômica. E já está na hora de estabelecer padrões claros de sustentabilidade e responsabilidade ambiental que as empresas devem cumprir para serem elegíveis a incentivos fiscais. Isso pode incluir auditorias ambientais regulares e padrões rigorosos de relatórios de sustentabilidade. De quebra, estimular a adoção de modelos de negócios baseados na economia circular, onde os resíduos de um processo são usados como insumos para outro, reduzindo o desperdício e promovendo a sustentabilidade.
Desigualdades regionais
Por fim, ao revisar e reestruturar o sistema de incentivos fiscais, o Brasil tem a oportunidade de promover um desenvolvimento mais sustentável e equitativo, na perspectiva da redução das desigualdades regionais e das tragédias humanas na Amazônia e sua infraestrutura precária e letal. Ao combinar estímulos fiscais com educação, inovação e infraestrutura apropriada, é possível avançar em direção a um futuro mais construtivo na ótica da sustentabilidade e da prosperidade para todos.
(*) Nelson é economista, empresário e presidente do Sindicato da Indústria Metalúrgica, Metalomecânica e de Materiais Elétricos de Manaus, conselheiro do CIEAM e vice-presidente da FIEAM, além de diretor da CNI.
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