Especialista em ONA e WHPCA alerta que a presença de apenas um serviço no Amazonas gera sofrimento evitável. SES-AM foi questionada sobre expansão e gestão de políticas, mas não respondeu
Déficit de Cuidados Paliativos no Amazonas
Manaus (AM) – O Amazonas enfrenta lacuna estrutural em saúde, contando com apenas um serviço de Cuidados Paliativos em um universo de 234 unidades existentes no Brasil. O déficit impacta diretamente a sobrevida, o custo social e a dignidade de milhares de pacientes com doenças graves ou crônicas na capital e no interior do estado.
O Portal Meu Amazonas protocolou, em 22 de outubro, um pedido de informação à Secretaria de Estado de Saúde (SES-AM), buscando dados sobre a política pública para a área. As indagações incluíram o número de unidades e equipes multidisciplinares, os planos de expansão para o interior e a previsão de orçamento e capacitação profissional. Até a publicação desta reportagem, contudo, a SES-AM optou por não emitir retorno oficial sobre as questões de gestão e transparência.
Douglas Crispim alerta para impactos evitáveis

Douglas Crispim, diretor da Worldwide Hospice Palliative Care Alliance (WHPCA) e membro da Organização Nacional de Acreditação (ONA), classifica a situação como um impacto “imenso e silencioso”.
“Quando um estado do tamanho do Amazonas conta com apenas um serviço estruturado, o resultado é que milhares de pessoas com doenças graves acabam enfrentando dor, angústia e sofrimento desnecessário,” afirma Dr. Crispim.
O especialista ressalta que a ausência de suporte paliativo eleva o número de internações evitáveis, sobrecarrega financeiramente o sistema e resulta em sofrimento familiar prolongado, contrariando a evidência científica de que o cuidado precoce melhora o conforto e pode prolongar a vida.
Desafios logísticos e o papel da Telesaúde
Reconhecendo as barreiras logísticas — distâncias e deslocamentos fluviais — o Dr. Crispim defende a telesaúde como a solução de eficiência para o Contexto Amazônico.
“A tecnologia permite que equipes em áreas ribeirinhas recebam orientação especializada em tempo real, evitando o sofrimento e os altos custos de remoções desnecessárias. O modelo sugerido é o “hub and spoke” (centro e raios), com Manaus como centro de excelência, conectando polos regionais através de telematriciamento contínuo. Gestão, ciência e sensibilidade precisam caminhar juntas,” pontua o diretor da WHPCA.
Cuidado paliativo: ciência e humanização
Em uma perspectiva clínica, Crispim desmistifica a crença popular de que os Cuidados Paliativos se restringem à fase terminal. O foco é o cuidado ativo e integral que deve ser introduzido no sistema de saúde desde o diagnóstico de doenças graves ou crônicas. O objetivo é a gestão de sintomas (dor, ansiedade) e o suporte existencial, acompanhando o tratamento curativo.
“É como construir um novo andar no sistema de saúde — um que cuide do sofrimento humano invisível,” conceitua o médico.
Diretrizes para a SES-AM – Exigência de políticas e gestão estruturada
O especialista ressalta que a urgência exige da SES-AM a implementação da Política Nacional de Cuidados Paliativos e a criação de um Comitê Estadual permanente. Ele enfatiza que a solução exige um modelo de gestão sofisticado e de alta performance, e não apenas estruturas físicas.
“Enquanto os gestores não entenderem que investir em equipes de alta performance e em modelos gerenciais sólidos é tão importante quanto construir estruturas físicas, continuaremos enxugando gelo,” adverte Crispim.
Para ele, é urgente a estruturação de uma rede hierarquizada em Manaus e nos polos macrorregionais, integrando a telesaúde para evitar que a falta de seriedade na implantação de serviços custe a dignidade humana.
Eficiência econômica e dignidade humana
Douglas Crispim conclui que os Cuidados Paliativos são uma estratégia de eficiência econômica e humanização: “Eles podem salvar o sistema de saúde.”
Ao oferecer o cuidado de forma precoce, o sistema reduz desperdício, evita intervenções desnecessárias e devolve a autonomia ao paciente. A tecnologia oferece a “estrada possível” para o interior do Amazonas, mas o estado precisa demonstrar coragem gerencial e transparência nas políticas públicas.
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