Manaus (AM) – A tese do marco temporal, que questiona a ocupação de territórios indígenas antes da promulgação da Constituição de 1988, coloca em risco os povos indígenas que habitam a região da BR-319, rodovia que liga o Amazonas a Rondônia.
A falta de demarcação de terras e a pressão de obras, invasões e desmatamento aumentam as preocupações dos povos indígenas na Amazônia.
Além disso, de acordo com lideranças e associações indígenas, a situação é ainda mais grave para os povos indígenas isolados, que podem ser alvo de contato compulsório.
Projeto em tramitação no Senado e STF
O Projeto de Lei (PL) 490/2007, que trata do marco temporal, foi aprovado na Câmara dos Deputados e está em tramitação no Senado e no Supremo Tribunal Federal (STF).
Pelo menos 18 povos indígenas vivem nas 69 terras indígenas da área de influência da BR-319, incluindo povos isolados. Apenas duas terras foram homologadas antes de 5 de outubro de 1988, e sete ainda estão em processo de homologação.
Para Marciely Ayap Tupari, coordenadora secretária da Coiab, o marco temporal pode prejudicar as homologações:
“A tese do marco temporal pode paralisar o processo de homologação destes territórios indígenas e abri-los para a grilagem, garimpo e desmatamento. Em todos os seus aspectos, o marco temporal é uma ameaça aos povos que já têm contato e aos povos que vivem de forma autônoma.”
Impactos da BR-319:
Desde sua construção em 1972, a BR-319 já causou impactos negativos às populações indígenas na região. Territórios foram perdidos, modos de vida foram afetados e problemas como desmatamento, grilagem de terras e invasões se tornaram recorrentes.
A aprovação do marco temporal pode intensificar as ameaças enfrentadas pelos povos indígenas da BR-319, especialmente aqueles cujos territórios ainda não foram demarcados.
A tese impede a demarcação de terras não consideradas ocupadas antes de 5 de outubro de 1988 e propõe a não expansão dos territórios já demarcados.
Para Tayane Carvalho, consultora do Idesam, caso aprovado, indígenas serão prejudicados.
“O marco temporal impedirá a demarcação das terras que não forem consideradas efetivamente ocupadas antes de 5 de outubro de 1988, além de trazer como proposta a não expansão dos territórios que já foram demarcados.”
Desconsideração dos contextos históricos:
A tese do marco temporal desconsidera os impactos sofridos pelos povos indígenas, que foram expulsos de suas terras durante a ditadura militar e lutaram para recuperá-las. Além disso, a insegurança fundiária e a busca por expansão do agronegócio na região acirram os conflitos locais.
Para Bruno Walter Caporrino, antropólogo e indigenista, a tese é criminosa.
“Essa pretensa ‘tese’ é criminosa, hedionda, pois diz que só se deve demarcar terras indígenas dos povos que não foram exterminados ou expulsos de onde estiveram há milênios. Considerando-se tudo isso, é de um cinismo tão absurdo a tese do marco temporal que o poder judiciário brasileiro e o poder legislativo deveriam ser julgados por colocar isso em pauta.”
Tese do marco temporal:
A tese do marco temporal argumenta que as terras desocupadas ou ocupadas por outras pessoas na data de promulgação da Constituição não podem ser demarcadas como terras indígenas.
Essa proposta desconsidera que muitas comunidades indígenas foram expulsas de seus territórios e só conseguiram retornar após 1988.
Contexto legislativo e judiciário:
O PL 490/2007 propõe alterações no Estatuto do Índio, exigindo aprovação legislativa para a demarcação de terras indígenas. Paralelamente, o STF está julgando o Recurso Extraordinário com repercussão geral 1.017.365, que pode rejeitar a tese do marco temporal.
A votação terá impacto em casos semelhantes que tramitam nas instâncias inferiores.
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