Imagens raras e pesquisas históricas revelam como o látex, símbolo da opulência amazônica, era processado a céu aberto em plena capital
Manaus (AM) – Entre 1870 e 1912, Manaus se consolidou como o coração do mundo da borracha, na época que ficou conhecida como Época Áurea da Borracha no Amazonas. O luxo dos palacetes e o esplendor do Teatro Amazonas escondiam, porém, um cenário bem menos nobre: o beneficiamento da borracha feito nas próprias ruas da cidade. Fotografias e acervos confirmam que o látex, extraído nos seringais, era lavado, seco e prensado a céu aberto — em praças, becos e vias próximas ao porto.
Essa prática improvisada não era casual, mas uma estratégia logística imposta pela urgência da exportação. A alta demanda mundial por borracha superava a capacidade das fábricas locais. Sem galpões suficientes e pressionados por prazos internacionais, trabalhadores e comerciantes transformavam calçadas e trapiches em verdadeiros pátios industriais.
O beneficiamento a céu aberto: urgência e improviso
No auge do Ciclo, o volume de produção era tão grande que Manaus não comportava o próprio sucesso dos empreendimentos. O beneficiamento, que incluía lavar, secar e prensar o látex em blocos, exigia espaço, agilidade e proximidade com o rio.
Segundo registros do Instituto Durango Duarte (IDD), o uso de ruas e praças era comum entre seringalistas e pequenos comerciantes. A prioridade era o embarque imediato rumo à Europa e aos Estados Unidos — não a estética urbana nem a higiene. O centro da cidade tornou-se um mosaico de fardos empilhados, fumaça de secagem e o cheiro forte da goma.
Uma cidade moldada pela exportação
Essa fase da história manauara revela o paradoxo da modernidade amazônica. O ouro branco financiou o luxo da capital, mas não consolidou uma base industrial sustentável. A riqueza escorria pelas ruas com o mesmo ritmo em que deixava o porto rumo ao exterior.
O historiador Raimundo Costa, da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), resume o cenário:
“As imagens de trabalhadores manipulando o látex nas praças de Manaus são a prova visual de um modelo econômico extrativista. A prioridade era embarcar, não organizar. A borracha era beneficiada nas ruas porque a pressa valia mais que o planejamento.”
Homens e mulheres, movidos pela urgência do comércio, transformaram o centro em uma fábrica improvisada. As fotografias do IDD documentam esse cotidiano frenético — e revelam uma cidade que crescia sobre o improviso, enquanto o mundo se encantava com sua riqueza efêmera.
Reflexo histórico da Amazônia contemporânea
O beneficiamento da borracha nas ruas não é apenas um detalhe curioso: é o símbolo da economia extrativista que ainda marca a região. A cidade viveu o esplendor da modernidade sem consolidar suas bases produtivas.
O fato da maior riqueza do Amazonas à época ter sido processada em plena rua explica parte da contradição que ainda define a Amazônia: abundância de recursos, mas dependência de estruturas externas para transformá-los.
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